Já foi muito estranho fingir a noite inteira para a família dele. Era "nora" pra cá e "cunhada" para lá. Tudo isso debaixo do olhar vigilante de Gale e do divertido Peter. E agora eu fingiria no cinema.
O.K
Vai dar tudo certo. São só algumas horas. Respirei fundo e fui até seu carro.
Peeta saiu e abriu a porta dianteira pra mim. Ele estava incrível em uma camiseta azul-marinho - sob uma jaqueta preta - e calça jeans preta. Sorri para ele antes de entrar no carro.
- Oi, Kat.
Quase morri de susto quando a voz veio do banco de trás. Com a mão sobre o perito virei e encontrei Peter me encarando. Ele usava uma jaqueta marrom sobre uma camiseta branca de gola V. Sua beleza era de matar qualquer menina do coração.
Eu não me constrangia na sua presença porque depois de um tempo cheguei à conclusão de que havia imaginado um significado por trás de seu comportamento na noite anterior. Era isso. Tudo imaginação.
Era apenas a novidade de conhecer alguém diferente. Ele não agira de maneira estranhamente maliciosa. Ou era nisso que eu queria acreditar.
- Desculpe. Eu não queria assustá-la.
- Eu não me assustei. - Menti descaradamente. - Sem querer ser rude, mas o que você está fazendo aqui? - Perguntei vendo Peeta abrir a porta do motorista.
- Você não me deixaria sozinho em casa em um sábado a tarde não é? - Abri um sorrisinho.
Se você desse uma única volta no centro da cidade, tenho certeza de que não seria difícil arrumar algumas garotas da minha escola loucas para lhe fazer companhia.
Felizmente meu bom-senso me fez dizer apenas:
- Não. É claro que não.
- Cato e Madge nos encontraram lá. - Peeta falou, ligando o carro.
Ele não precisava dizer que Clove e Gale também estariam lá. Seria pleonasmo.
Os dois passaram o caminho inteiro conversando sobre o Lakers e sobre o Bulls. Parecia haver um pequeno - e estou usando eufemismo aqui - desacordo sobre qual dos dois times era o melhor de todos os tempos.
Eu meio que tentei me manter fora da conversa, respondendo com monossílabas as perguntas que me eram feitas. Mas tive que intervir quando Peeta ameaçou para o carro e resolver no meio da estrada. Com os punhos.
- Já chega, crianças. - Exclamei no meu melhor tom de comando. - Mas Kat...
- Eu disse "ja chega". O assunto acabou.
Os dois resmungaram algo incompreensível, mas ficaram quietos. O resto do caminho foi absolutamente silencioso. O que, devo dizer, foi bem melhor do que a desagradável discussão sobre futebol. Estacionamos não muito longe do cinema e tive um sobressalto quando Peeta entrelaçou minha mão na dele ao caminharmos até a frente do grande prédio bege.
Namorados...
Nós "somos" namorados. Isso era o tipo de coisa bem normal para namorados. Não podia me assustar cada vez que a mão quente segurasse a minha. Nem quando ele me abraçava pela cintura e me deixava perto do corpo maravilhoso que...
- Finalmente vocês chegaram! - A voz de Madge interrompeu meus pensamentos. - Faz horas que estamos esperando por vocês.
Revirei os olhos e percebi que Peeta fez o mesmo.
Madge estava deslumbrante em um vestido jeans e botas de cano alto pretas. Gale também usava jeans e um suéter cinza, combinando perfeitamente com seus olhos.
- Querida prima, você saiu apenas cinco minutos antes de nós. Então, de acordo com alguns cálculos matemáticos e um pouco de física básica, você não pode estar aqui a mais de dez minutos.
-Quem é você? A polícia dos números? - Cruzou os braços, bufando. - Nós quase perdemos o começo da sessão.
Peter deu uma olhada nos cartazes e, assim, soube que a primeira sessão ainda levaria meia-hora para começar. Ele abriu a boca para retrucar, mas o interrompi, tentando acabar com a "discussão" deles:
-O.k. Nós estamos aqui. Cadê Cato e Clove?
- Bem aqui.
A voz firme de Cato soou bem ao meu lado.
Os cabelos pretos de Clove estavam presos em uma trança frouxa que descansava sobre a jaqueta jeans vermelho sangue que ela usava. Sob a jaqueta havia uma blusa branca cor de neve e uma calça jeans claro. As sandálias de salto alto eram do mesmo tom que a vermelho da
jaqueta. Ela abraçava o namorado que estava com uma calça jeans preta e um moletom verde. Apesar dos saltos imensos que usava, não chegava nem no ombro dele.
Os dois realmente faziam um casal bonito. Ambos eram deslumbrantes.
Mas eles não estavam tão deslumbrantes no momento. Na verdade, eles estavam meio ofegantes, os lábios inchados.
Não precisava ser um gênio para adivinhar o que eles estavam fazendo.
- O que vamos assistir? Peter perguntou.
-Maze Runner! Maze Runner! - Exclamei.
- Sim. Vamos assistir Maze Runner! - Gale me apoiou.
- Vocês dois já assistiram esse Maze Runner duas vezes. - Madge revirou os olhos - Vamos assistir outra coisa.
Na verdade, foram cinco vezes. Porém eu não iria corrigi-la. A baixinha virou para a parede onde estavam pregados os cartazes promocionais dos filmes em exibição.
- Vamos assistir O mistério das duas irmãs - Apontou para o cartaz logo atrás dela.
- Terror? De novo? - Sussurrei. - Não! Nós assistimos a um filme de terror semana passada. - Cruzei os braços.
- Esse filme parece ser legal - Clove falou, analisando o cartaz. - Eu não quero assistir a outro filme de terror!
Será que alguém estava me ouvindo?
- O.K. Vai ser esse. Vamos comprar os ingressos. - Cato falou já saindo para a bilheteria.
- Ótimo! - Joguei os braços para o alto e sai pisando duro para dentro do cinema.
Será que ninguém leva minha opinião a sério nessa amizade?
Corri para o balcão vermelho e lustroso. Tinha certeza de que Peeta não me deixaria comprar o ingresso, então aproveitaria enquanto ele estava ocupado fazendo exatamente isso. Já que eu seria obrigada a passar por horas de horror, não iria despreparada. Iria me abastecer.
- Em que posso ajuda-lá? - Um garoto meio gordinho apareceu do outro lado do balcão e perguntou.
- Eu quero uma pipoca média, uma Coca grande. E três sacos de nachos.- Apontei para a prateleira atrás do garoto - E quero também dos pacotes de tubes. Por favor.
Ele foi pegando o que eu pedia e colocando sobre uma bandeja de plástico cinza. Em nenhum momento demonstrou surpresa por meu pedido monstro.
- Também quero um pacote de balas de menta.
Eu não gostava desse tipo de bala, mas sim Peeta. Levaria esse pacote por três motivos: 1- retribuir o coca cola que ele havia me dado naquele último fatídico dia em que estivemos nesse mesmo cinema; 2- seria estranho eu não levar nada para o meu "namorado"; 3- acalmá-lo quando ele ficar bravo por eu não tê-lo deixado pagar meus lanchinhos.
- Mais alguma coisa?
Encarei a bandeja em minha frente. Acho que não estava faltando nada.
- Não obrigada. Quanto deu tudo?
- Trinta e oito dólares.
Antes que eu pudesse pegar o dinheiro em minha bota, um braço surgiu ao lado de meu direito, a mão segurando uma nota de cinquenta dólares.
- Aqui. - Uma voz masculina falou atrás de mim.
- Não. Não. Você não vai pagar dessa vez, Peeta. - Falei brava sem olhar para trás. -Por favor, ignore-o. - Dirigi meu melhor sorriso forçado ao atendente.
- Se eu não for Peeta, eu posso pagar? - Um ar de riso.
Vir-me-ei.
- Peter! Você, com certeza, não pagará meu lanche.
Ele recolheu o braço e colocou a mão sobre o coração.
-Ah! Essa doeu. - mas ainda sorria.
Chacoalhei a cabeça, sorrindo e voltei a atenção ao garoto que esperava pelo dinheiro. Abaixando, peguei uma nota de cinquenta e entreguei a ele.
- Por que a sua nota é melhor do que a minha?
- Essa pergunta nem mesmo merece uma resposta, Peter. Depois de ir ao caixa, o atendente retornou e entregou meu troco. - Obrigada. - Falei, conferindo o dinheiro que recebi.
Depois de chegar se tudo estava certo, resolvi ir para junto de meus amigos. Contudo, havia o pequeno problema que meu iPhone estava
ocupando minha mão esquerda e não tinha espaço sobre a bandeja para colocá-lo a fim de libertar minhas mãos. Como eu carregaria a bandeja?
Tomei a cabeça para o lado, analisando as possibilidades.
-Permita-me ajudá-la. - Peter surgiu ao meu lado e pegou a bandeja, arqueando a sobrancelha - Você vai alimentar um pequeno exército?
- Não. - Respondi enquanto caminhávamos para onde os outros estavam - É que eu não gosto de filmes de terror. E quando me obrigam a assisti-los, preciso me manter ocupada para não gritar de pânico. Entende?
- Quer dizer que você come muito para se distrair do filme porque tem medo?
- Mais ou menos isso. Comida me acalma. principalmente Coca. Coca e Peeta.
- Entendo. Por que não me deixou pagar os seus lanches milagrosos então?
- Porque não.
- " Porque não" não é resposta.
- Isso está ficando infantil demais para o meu gosto.
Peter estava presta a responder quando alcançamos nossos amigos e Cato gargalhou:
- Faz quantos dias que você não come, Peter?
- É da Kat.
Todos me olharam espantados. E não sei se foi minha impressão mais vi Peeta travar o maxilar.
O.K eu já estava viajando na batatinha de novo.
- Que foi? Vocês vão me obrigar a assistir a droga de um filme de terror, não é? Preciso comer. - Ergui as mãos para enfatizar as palavras.
- Vamos entrar. O Filme já vai começar. - Clove foi a primeira a se recuperar do choque.
Peeta puxou delicadamente a minha mão, então estávamos um pouco mais atrás dos outros.
- Nós não precisamos assistir a esse filme se você não quiser.
E eu me derreti. Esse gesto foi tão fofo. Ele, apesar de gostar de filmes de terror, sacrificaria seu ingresso por mim.
- Não, tudo bem. Vamos. Já tenho tudo que preciso. - Sorri indicando a bandeja que Peter carregava para dentro da sala que o filme seria exibido.
- Certo. - Entrelaçou a mão na minha e seguimos os outros. - Aliás, por que não me esperou para ir comprar os lanches? - Perguntou pouco antes de chegarmos à fileira onde os outros estavam.
- Desculpe. - murmurei apenas.
Sabia que ele ficaria chateado se soubesse que eu não queria que pagasse.
- Sentem logo, casal. Vocês vão atrapalhar as outras pessoas. - Alice falou.
- Aqui seus suprimentos. - Passou a bandeja para o meu colo.
- Obrigada Peter. Vocês estão servidos? - Ofereci, apontando a bandeja.
Eles responderam que não queriam nada, mas agradeceram. Dando de ombros, comecei a vasculhar minha bandeja. Quando encontrei o pacote de bala de menta.
- Para você, amor - Estendi o pacote para Peeta.
- Obrigada, Amor.
Ganhar um sorriso daqueles também compensava os estragos que eu viria a sofrer.
Sorri, me ajeitando na poltrona e enfiando um punhado de pipoca na boca, o filme estava começando.
Uma hora depois eu estava em um daqueles momentos "espiando para morrer de medo depois" e, como queria estar preparada, tateei a bandeja a procura de algo para aplacar meu medo, mas não encontrei nada.
Abaixei a vista e só encontrei embalagens vazias.
NÃO.
Meu estoque havia acabado "Como eu comi tanta coisa em tão pouco tempo?
Minha boca se escancarou. Estava chocada. Levantei os olhos, evitando as provas do crime. E foi bem a tempo de ver um cara se contorcendo grotescamente na beira de um penhasco.
Ofeguei, assustada. Meu corpo inteiro se retesou.
Foi quando senti um braço quente passar por meus ombros. Acho que se não estivesse tão tensa de medo, teria me afastado por pânico.
- Amor, está tudo bem? - Peeta sussurrou em meu ouvido. Fiquei completamente arrepiada.
- Estou bem - Consegui dizer.
- Vem aqui.
Ele puxou o braço de leve, me fazendo ficar meio de lado encostada em seu peito.
- Já está acabando, amor.
Eu realmente me sentia segura em seus braços.
Isso era um problema. Porque era tudo fingimento.
"Agarre o que puder. Talvez nunca consiga mais do que está tendo nesses últimos dois dias" Sussurrou uma vozinha em minha cabeça.
Analisando o que ela disse, percebi ser verdade. Então relaxei nos braços dele.
XXX
Estávamos na Fila do caixa, ele na minha frente, minha mão direita sobre a mão direita dele - nossos dedos entrelaçados - enquanto eu apoiava meu queixo em suas costas.
Eu podia facilmente me perder naquela fantasia.
Eu lutava contra. Lutava arduamente para aproveitar os momentos sem perder a razão lógica por trás de tudo. Mas Peeta era um ator muito bom. Por vezes, eu acreditava na mentira, assim como nossos amigos.
Eles estavam atrás de nós na fila, entretidos em uma conversa animada, mas vez ou outra eu senti um olhar em minhas costas.
Fui despertada de meus devaneios quando Peeta me puxou pela mão para frente. Chegou a nossa hora de fazer o pedido.
- Amor, o que você vai querer?
Eu amava demais McDonal's, mas tudo que comi no cinema acabou com meu apetite.
- O que você vai querer? - Devolvi a pergunta.
- Um Big Mac com fritas e refrigerante grande. - Respondeu olhando para a funcionária, aproveitando assim para fazer seu pedido.
- Posso ficar com suas fritas? - Perguntei, timidamente.
- É claro que sim. Mas você não gostaria de pedir um lanche? - Franziu o cenho.
- Não, obrigada. Só as fritas mesmo.
Esbocei um sorriso e ele fez o mesmo. Peeta pagou o lanche e esperamos um pouco enquanto o mesmo era feito. Depois de pronto ele pegou a bandeja e fomos sentar em uma grande mesa redonda.
- Desculpe-me por fazê-la passar por tudo isso hoje, Kat. - Peeta aproveitou que os outros ainda estavam fazendo os próprios pedidos.
- O quê?
- Você sabe. - Falou, sem jeito - Você não tinha nenhuma obrigação de passar o dia todo comigo. Fingindo.
- Eu sei que não.
Você também não precisa aguentar calado todas aquelas minhas perseguições.
- Estou fazendo um favor a um amigo. - Menti. - Está tudo bem. - Obrigado. - Sussurrou.
Nossa conversa acabou nesse ponto porque os outros chegaram, carregando suas bandejas.
Depois de inúmeras brincadeiras e infinitas gargalhadas e, é claro, fast food, estávamos prontos para ir. Como os garotos resolveram comprar sorvete antes de partirmos, corri para o banheiro. Tanta coca-cola tinha seus efeitos.
Quando voltei ao centro da lanchonete, vi que meus amigos, continuavam no balcão do sorvete, mas Peeta não estava entre eles.
- Cadê o Peeta, Madge?
- Está lá fora. Ele não quis nada. - Apontou para uma grande janela de vidro de onde eu pude vê-lo.
Acenei com a cabeça e sai do estabelecimento, indo até Peeta. - O que está fazendo aqui fora sozinho?
Ele pareceu não ouvir uma palavra do que eu disse. Continuou andando de um lado para o outro, passando a mão pelo cabelo.
- Peeta? - Fiquei em seu caminho, impedindo-o de continuar o percurso.
-Katniss! - Finalmente notou minha presença - Katniss, eu... quando você saiu eles perguntaram porque nunca viram um beijo nosso. Eles vão começar a desconfiar. - Seu tom estava carregado de preocupação.
Eu não havia pensado nessa parte do fingimento. Que desculpa nós daríamos para aquilo? Eu ainda me cercava dessa questão quando as mãos de Peeta descansaram na minha cintura. Ele ainda deu uma espiada rápida na entrada do McDonald's antes de sussurrar:
- Desculpe.
Eu estava prestes a perguntar " o quê?" quando a boca dele cobriu a minha em um beijo.

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